quinta-feira, 12 de março de 2009

Os Impiedosos


Sim, eu sei e todos nós sabemos que este mundo é um vasto hospício, cheio de sandices e aberrações e quanto mais nele se vive, mais tenho disso a mais plena e absoluta certeza, até que alguém seja capaz de me provar absolutamente o contrário. Há certas coisas que me são impossíveis de aceitar, mesmo que eu entenda as razões ou desrazões que estão por trás delas. Algumas me parecem tão ridículas que só me provocam um esgar sardônico de riso. Entretanto, outras há, que de tão cruéis e desumanas, acabam por me fazer perder o siso e só me dão vontade de repúdio, me causam ânsias de vômito de tão repugnantes que são.
Li nos jornais o triste caso da garotinha de apenas nove anos de idade, que vinha sendo sistematicamente violentada pelo padrasto desde os seis. Resultado, a criança engravidou de um par de gêmeos. A menina franzina, sofrendo de desnutrição crônica, em risco de vida devido à gravidez de alto risco, poderia vir a morrer durante a gestação, em que a suprema ameaça, nesses casos, é a eclâmpsia, além das doenças venéreas que o estuprador lhe transmitiu. Eis aí, exposto aos olhos e corações de todos o drama, a tragédia de uma criança a quem roubaram, de um modo infinitamente perverso, a inocência e a infância.

Levada aos médicos, a opinião dos especialistas deu-se de forma unânime, segundo os preceitos da medicina. A garota de apenas nove anos, grávida de gêmeos, os riscos de complicações clínicas eram muito altos. As chances da gravidez vir a termo eram demasiado remotas. E mesmo supondo que o parto ocorresse, a menina poderia certamente ficar com sequelas pelo aumento da pressão arterial e ainda haveria a possibilidade dela tornar-se estéril. O aborto foi autorizado segundo os rigores da lei e a vida da garota ficou preservada. Resta agora, tratar-lhe as sequelas psicológicas que a marcarão pelo resto de sua vida.

Até aí, o caso parecia bem resolvido e a garota seguiria em frente com a sua vida, carregando seu drama e seu sofrimento, que os psicólogos e o tempo findariam, talvez, por cicatrizar. Quando tudo parecia voltar ao normal, aparece em cena o arcebispo de Olinda e Recife, conhecido por Dom Dédé, que resolveu excomungar os médicos que fizeram o aborto e a mãe da criança, no que foi prontamente apoiado pela CNBB e o Vaticano. Tal atitude é a mais completa negação da solidariedade, da fraternidade, da misericórdia e do perdão. Ora, na minha opinião, que vá o padreco, a CNBB e o Vaticano lamber sabão, enfiar flatos em cordão e arrancar toco de jurema com pinça de sobrancelha lá no sertão dos Inhamuns. (Airton Monte – Jornal O Povo em 12/03/2009)

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