segunda-feira, 21 de abril de 2008

Vendaval (Antonio Miranda Fernandes)


Ao entardecer o raio despencou como malho

partindo rochas numa obra doente de cantaria

e o escarcéu se fez com tantos ralhos que

a chuva caiu do céu rasgado e enegrecido

como ventre aberto a força parindo viu

vez chicoteando o mar que se eriçou friorento.

Quantas vezes única vida é preciso morrer

para se provar que nascer já foi valentia?

Uma cabeça gigante balançou para os lados

e tremeu o mundo sacudido por força tamanha

abanando com violência os ventos gelados

boca da noite que se abriu engolindo o dia.

O céu onde deviam morar anjos se fez fétido...

cheirava a enxofre...

e o dragão abriu as ventas

cuspindo mais fogo...

mais raios...

mais ameaças...

uma quantidade de demônios zangados sobre nós

mortos de fome e cheios de ira e desgraças.

Eu pensei nos marinheiros em mar aberto

nos seus frientos pensamentos em seus filhos

no espremer do peito esmagando o coração

na nau de quente e açoitado útero de madeira,

onde eles se aninham tremendo de pavor

ora Deuses... parem com essa brincadeira

busquem na sapiência senil outra diversão.